sábado, 6 de outubro de 2007

Bilac para ler

Beijo eterno In: Sarças de fogo

Quero um beijo sem fim,

Que dure a vida inteira e aplaque o meu desejo!

Ferve-me o sangue. Acalma-o com teu beijo,

Beija-me assim!

O ouvido fecha ao rumor

Do mundo, e beija-me, querida!

Vive só para mim, só para a minha vida,

Só para o meu amor!

Fora, repouse em paz

Dormida em calmo sono a calma natureza,

Ou se debata, das tormentas presa, –

Beija inda mais!

E, enquanto o brando calor

Sinto em meu peito de teu seio,

Nossas bocas febris se unam com o mesmo anseio,

Com o mesmo ardente amor!

De arrebol a arrebol,

Vão-se os dias sem conto! e as noites, como os dias,

Sem conto vão-se, cálidas ou frias!

Rutile o sol

Esplêndido e abrasador!

No alto as estrelas coruscantes,

Tauxiando os largos céus, brilhem como diamantes!

Brilhe aqui dentro o amor!

Suceda a treva à luz!

Vele a noite de crepe a curva do horizonte;

Em véus de opala a madrugada aponte

Nos céus azuis,

E Vênus, como uma flor,

Brilhe, a sorrir, do ocaso à porta,

Brilhe à porta do oriente! A treva e a luz – que importa?

Só nos importa o amor.

Raive o sol no Verão!

Venha o Outono! do Inverno os frígidos vapores

Toldem o céu! das aves e das flores

Venha a estação!

Que nos importa o esplendor

Da primavera, e o firmamento

Limpo, e o sol cintilante, e a neve, e a chuva, e o vento?

– Beijemo-nos, amor!

Beijemo-nos! que o mar

Nossos beijos ouvindo, em pasmo a voz levanta!

E cante o sol! a ave desperte e cante!

Cante o luar,

Cheio de um novo fulgor!

Cante a amplidão! cante a floresta!

E a natureza toda, em delirante festa,

Cante, cante este amor!

Rasgue-se, à noite, o véu

Das neblinas, e o vento inquira o monte e o vale:

“Quem canta assim?” E uma áurea estrela fale

Do alto do céu

Ao mar, presa de pavor:

“Que agitação estranha é aquela?”

E o mar adoce a voz, e à curiosa estrela responda

Que é o amor

E a ave ao sol da manhã também

A asa vibrando à estrela que palpita

Responda ao vê-la desmaiada e aflita:

“Que beijo, irmã!

Pudesses ver com que ardor

Eles se beijam loucamente!”

E inveje-nos a estrela... e apague o olhar dormente,

Morta, morta de amor!...

Diz tua boca: “Vem!”

“Inda mais!” diz a minha, a soluçar... Exclama

Todo o meu corpo que o teu corpo chama:

“Morde também!”

Ai! morde! Que doce é a dor

Que me entra as carnes, e as tortura!

Beija mais! morde mais! que eu morra de ventura,

Morto por teu amor!

Quero um beijo sem fim,

Que dure a vida inteira e aplaque o meu desejo!

Ferve-me o sangue: acalma-o com teu beijo!

Beija-me assim!

O ouvido fecha ao rumor

Do mundo, e beija-me, querida!

Vive só para mim, só para a minha vida,

Só para o meu amor!



Requiescat In: Alma inquieta

Por que me vens, com o mesmo riso,

Por que me vens, com a mesma voz,

Lembrar aquele Paraíso,

Extinto para nós?

Por que levantas esta lousa?

Por que, entre as sombras funerais,

Vens acordar o que repousa,

O que não vive mais?

Ah! esqueçamos, esqueçamos

Que foste minha e que fui teu:

Não lembres mais que nos amamos,

Que o nosso amor morreu!

O amor é uma árvore ampla, e rica

De frutos de ouro, e de embriaguez:

Infelizmente, frutifica

Apenas uma vez...

Sob essas ramas perfumadas,

Teus beijos todos eram meus:

E as nossas almas abraçadas

Fugiam para Deus.

Mas os teus beijos esfriaram...

Lembra-te bem! lembra-te bem!

E as folhas pálidas murcharam,

E o nosso amor também.

Ah! frutos de ouro, que colhemos,

Frutos da cálida estação,

Com que delícia vos mordemos,

Com que sofreguidão!

Lembras-te? Os frutos eram doces...

Se inda os pudéssemos provar!

Se eu fosse teu... se minha fosses,

E eu te pudesse amar...

Em vão, porém, me beijas, louca!

Teu beijo, a palpitar e a arder,

Não achará, na minha boca,

Outro para o acolher.

Não há mais beijos, nem mais pranto!

Lembras-te? Quando te perdi

Beijei-te tanto, chorei tanto,

Com tanto amor por ti,

Que os olhos, vês? já tenho enxutos,

E a minha boca se cansou:

A árvore já não tem mais frutos!

Adeus! tudo acabou!

Outras paixões, outras idades!

Sejam os nossos corações

Dois relicários de saudades

E de recordações.

Ah! esqueçamos, esqueçamos!

Durma tranqüilo o nosso amor

Na cova rasa onde o enterramos

Entre os rosais em flor...


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